Responsabilidade civil pela perda de uma chance (Civil liability for the loss of a chance)

Journal Title: Revista do Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Year 2015, Vol 26, Issue 124

Abstract

Na esteira da prevalência de valores constitucionalmente definidos na interpretação do ordenamento jurídico, em vista da ineficiência de uma abordagem meramente legalista, e considerando as graves violações a direitos humanos cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, despontou o sobreprincípio da dignidade da pessoa humana. Considerando o valor do ser humano em si mesmo, tem-se uma mudança de perspectiva, inclusive no tocante à responsabilidade civil: da punição do agente que comete um ato ilícito para a reparação da vítima que sofre um dano injusto. É que o caráter punitivo da reparação para o agente que age com inobservância dos deveres de cuidado e a aferição do caráter ilícito e culposo da conduta para a responsabilização civil colocam-se em um plano secundário, quando confrontados com a necessidade de reparação de um dano sofrido por uma pessoa que não lhe deu causa. Nesse contexto, desenvolveu-se a objetivação e a coletivização da responsabilidade civil, com o subsequente reconhecimento da responsabilidade civil objetiva e a indenização do dano moral, inclusive por ricochete. Entretanto, tais institutos não se mostraram suficientes para solucionar toda a complexidade das relações sociais tal qual se apresentavam no decorrer do século XX. Assim, a jurisprudência francesa, especialmente a Corte de Cassação, a partir da década de 1930, passou a reconhecer a “réparation d’une perte d’une chance”, comumente traduzida para o português como responsabilidade civil pela perda de uma chance. Conquanto não seja possível citar um leading case francês, em 1932, aquela instância superior confirmou decisão que condenou um notário que, agindo com culpa, inviabilizou a chance de seu cliente adquirir propriedade rural como desejava, reconhecendo a existência de prejuízo e nexo causal. No entanto, a partir da década de 1950, a aplicação da referida teoria havia se difundido com a compreensão de que “a perda de uma chance constitui não um prejuízo eventual, mas um prejuízo certo, ensejando o direito à indenização”. In the wake of the prevalence of constitutionally defined values in the interpretation of the legal system, in view of the inefficiency of a merely legalistic approach, and considering the serious violations of human rights committed during the Second World War, the overriding principle of the dignity of the human person emerged. Considering the value of the human being in itself, there has been a change of perspective, including with regard to civil liability: from punishing the agent who commits an unlawful act to compensating the victim who suffers unjust damage. The fact is that the punitive nature of reparation for the agent who acts in breach of the duty of care and the assessment of the illicit and culpable nature of the conduct for civil liability are placed on a secondary level when confronted with the need for reparation for damage suffered by a person who did not cause it. In this context, the objectification and collectivization of civil liability developed, with the subsequent recognition of objective civil liability and compensation for moral damage, including by ricochet. However, these institutes did not prove sufficient to solve all the complexity of social relations as they were presented in the course of the 20th century. Thus, French jurisprudence, especially the Court of Cassation, from the 1930s onwards, began to recognize the "réparation d'une perte d'une chance", commonly translated into Portuguese as civil liability for the loss of a chance.

Authors and Affiliations

Carolina Castro Costa

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Carolina Castro Costa (2015). Responsabilidade civil pela perda de uma chance (Civil liability for the loss of a chance). Revista do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, 26(124), -. https://europub.co.uk/articles/-A-765713